terça-feira, 24 de janeiro de 2012

"Solidão" e "O Negociante de gado" - Marc Chagall

Solidão - Marc Chagall

 Fonte: Maria Luiza Calim de Carvalho Costa UNESP/Bauru ( MARC CHAGALL E SERGIO SANT`ANNA NAILUSTRAÇÃO DE DARCY PENTEADO)e Carmen Lúcia Fornari Diez (THEODOR ADORNO E MARC CHAGALL:
estéticas de manifesto como confinium de resistência)
"Marc Chagall nasceu em 1887, na cidade de Vitebsk, na Rússia. Seu nome verdadeiro era Moshe Segall, mais tarde adotou o nome artístico de Marc Chagall e assim ficou conhecido no mundo das artes plásticas.
 Marc Chagall  espelha em suas obras os acontecimentos de sua infância. Esse universo figurativo de Chagall está implantado nas tradições de sua origem, no pensamento anti-racional da Rússia e na rigorosa ausência da arte figurativa no judaísmo. “Neste sentido, os cenários de Chagall nunca estão isolados de um mundo de idéias místicas, o qual transforma, antes de tudo,os motivos em símbolos, em representantes de uma realidade invisível” (WALTHER&METZGER,1994,p.24).

Um dos seus quadros mais conhecidos traz o título Solidão. Nesse quadro, Chagall retratou uma vaquinha tranqüila, deitada junto a um violino, casas russas em um plano de fundo e uma enorme figura de um judeu em primeiro plano. O judeu se apresenta como uma pessoa melancólica, pensativa, segurando um rolo de Torá, o livro sagrado dos judeus. Complementando a cena, vemos um anjo voando. Anjos são imagens recorrentes nos quadros de Chagall. A vaca, de acordo com WALTHER (1994) simboliza o povo de Israel, “...correspondendo às palavras do Profeta Oséias: «Sim, Israel é teimoso como uma vaca» Ambos simbolizam o povo de Chagall, o povo na diáspora, tal qual revela o ambiente russo. O homem tornou-se Asevero, o judeu errante, que vagueia por esse mundo infinito sem saber qual será seu futuro.”(p.60)



Óleo intitulado «O Negociante de Gado»
(1912)
Aqui aparece  em cena a simplicidade harmônica da vida campesina. “Metáforas de tranqüilidade dominam cenas rústicas: o potro protegido na barriga da égua, ainda por nascer, o cordeiro às costas da mulher, citando o motivo do Bom Pastor, a ponte que o carro atravessa calmamente”(WALTHER&METZGER,1994,p.27). A impressão geral da tela transmite uma descontração, que de certo modo, desvia a atenção de que o negociante dos animais os venderá, supostamente, a um matadouro. Apesar dessa impressão geral de tranqüilidade, observando-se mais atentamente a composição, percebe-se uma tensão quanto à direção: a carroça vai da esquerda para direita, em contraposição o homem, o gado sobre a carroça, a camponesa e a mulher que abraça o soldado, olham para a esquerda criando uma força contrária ao movimento da carroça. Nota-se que o cordeiro sobre os ombros da camponesa volta sua cabeça para a face da camponesa, impedindo,assim, que o olho do observador se evada do quadro pela esquerda. Abaixo  das patas do cavalo encontra-se um soldado sendo enlaçado por um braço de uma mulher como se estivesse se despedindo. As feições do soldado e da mulher inspiram tristeza. Está construída a metáfora do soldado que, como um gado ao matadouro, vai à guerra. A metáfora desconstrói a suposta cena ingênua campestre e traz a baila a denúncia das tristezas de uma guerra. A égua prenha alude à orfandade que uma guerra proporciona. A tensão, então, é representada à esquerda através da vida boa do campo que se deixa para traz e, à direita a direção do matadouro, da guerra, da morte. As rodas da carroça, que levam, inevitavelmente, o gado para o seu destino, pode-se interpretar como a roda da vida, que gira incessantemente num nascer, viver , morrer e nascer...



A queda de um Anjo - 1947

 “A Queda do Anjo”, iniciada em 1923 e terminada em 1947 realiza a síntese da trajetória artística do pintor e da queda do Reich. Este, representado no anjo vermelho que cai, não sem antes mutilar o menorah, signo de Israel. A única vela que restou, dentre sete, permaneceu acesa, indicando a resistência judaica, tema que continuará integrando os trabalhos posteriores do artista, com tonalidades menos torturadas, mas sempre presentes, mesmo quando retomou a mitologia grega com “A Queda de Ícaro”(1975) ou com “Orfeu”(1977).

 No primeiro momento tem-se a impressão de uma imagem caótica, com muitos elementos aparentemente desconectados uns dos outros. O título da obra oferece a primeira ancoragem para a leitura: A queda do anjo vermelho, enunciada em uma grande diagonal formada pelas asas, mas também, perpendicular às asas, pelo corpo do anjo.

Numa asa do anjo encontra-se Nossa Senhora com o Menino, ao lado dela um castiçal com uma vela e o Cristo Crucificado, são os motivos ligados à salvação. Na outra asa, um relógio, seria a tirania do tempo que a todos foi inferido através da origem do mal. A contagem do tempo supõe um fim: a morte; o relógio seria, então a representação da hora da morte. Nota-se que este anjo não é assexuado! Pelos seios e quadril percebe-se uma mulher.

 No canto inferior esquerdo do quadro está o judeu segurando o rolo das escrituras, alusão à passagem bíblica que a obra retrata. Entre o anjo e o judeu forma-se uma faixa diagonal, onde estão inseridos alguns elementos: Um homem com uma bengala, uma lua cheia, um violino e um animal, supostamente um cavalo.

 No âmbito da arte contemporânea, marcada pelo formalismo e a abstração, a pintura de Chagall se destaca pela importância que tem nela o elemento temático, de fundo onírico, que, por sua vez, reflete as profundas raízes afetivas e culturais do artista. Sua obra, moderna, assimilou todas as conquistas formais da arte contemporânea." (Fonte: Maria Luiza Calim de Carvalho Costa (UNESP/Bauru) e Carmen Lúcia Fornari Diez nas pesquisas no começo linkadas)